terça-feira, fevereiro 21, 2006

há duas semanas em Portugal; há uns minutos no Trombone

Praia de Santa Maria, domingo, 05.02.06

Este é o Skelvius (assim mesmo, com «k», dizem-me os meninos que não andam na escola nem sabem escrever); tem onze anos. Ou talvez seja o Victor (assim mesmo, com «c», dizem-me os meninos que não andam na escola nem sabem escrever); tem nove anos. Conheci-o numa praia da Ilha do Sal e estabelecemos uma espécie de acordo: eu levava-lhe maçãs, pão com manteiga e sumos do pequeno-almoço e ele ficava ali, a brincar na cadeira que me protegia do vento, enquanto eu lhe falava de Portugal. Sempre soube que ele, enquanto brincava com a mota que uns outros «portugas» quaisquer lhe tinham oferecido, nunca fixou a atenção nas minhas palavras sobre as motas que circulam em Lisboa e os carros e os prédios e o trânsito e as estradas e os jardins... E isso nem sequer nos importava: ele permanecia ali a manhã inteira sem me ouvir falar disso tudo e do Moby Dick, do Melville, e da praia do Guincho, tão ventosa como aquela, e dos tubarões que eu insistia que existiam naquela praia, naquela ilha, naquele mar; e eu ficava ali a manhã inteira a tentar perceber por que motivo as palavras tinham finalmente perdido o poder de se interporem entre nós.
O Skelvius (ou Victor) já não se lembra de mim. De certeza. E eu, para me lembrar dele, vou à pasta «As minhas fotografias», no meu computador. E depois dou-lhe um nome - pego no telemóvel, consulto as mensagens gravadas e lembro-me do que escrevi há quinze dias na Praia de Santa Maria: «Skelvius, 11 anos; Victor, 9 anos».
É a distância e é a memória que se interpõem entre nós.

1 Comments:

Blogger diogo said...

e a falta de sol...beijos

11:40  

Enviar um comentário

<< Home