segunda-feira, novembro 20, 2006

...Finalmente sinto.













Nú no cimo de um prédio de 12 andares a chuva fura-me a pele já enrugada e azul do frio, mais abaixo a cidade fervilha...finalmente sinto. Todas as segundas terças-feiras de cada mês venho aqui, ilegalmente subo fazendo-me passar um distribuidor de pizzas que se enganou no andar, subo até ao último andar e pela caixa do elevador ganho acesso ao topo deste edifício. Podia ser qualquer outro, escolho este por ser no quarteirão mais movimentado da baixa, entre duas saídas e duas entradas na cidade o ruído é permanente, os fumos dos escapes já rarefeitos pela a altura conferem-lhe um aroma particular, quase doce, os sons distantes das buzinas, das sirenes e das discussões parecem música...rock urbano, sem letra...música pautada por semáforos, composta por todos nós, no vento gritos, conversas trocadas, juras de amores não correspondidos, em cada gota de chuva um sentimento, em cada arrepio a certeza de que estou vivo.
Terça-feira, a segunda do mês de Novembro, ainda encafuado na cave onde trabalho, como recuperador de antiguidades, oiço a chuva, oiço cidade acima de mim que me chama...não paro de olhar para o relógio, não vejo a hora de vestir a pele de distribuidor de pizzas subir ao 12º, fechar os olhos e ter aquilo a que eu chamo um momento? só um momento. Estar só um momento, sem mais ninguém, sem roupa, sem o tic-tac do relógio ou a pressão do tempo, as antiguidades que recupero ensinaram-me a dar valor ao presente, ensinaram-me a ver o tempo, a senti-lo.
Toco... hoje para o 9 Dtº - ? Quem é???-?Entrega de Pizzas..."o coração acelera enquanto não oiço o som metálico da porta a abrir........................ Finalmente.
Passo, incógnito, na sombra em frente à porta do porteiro, subo o lance de escadas e por esta altura o meu coração está ao rubro. O velho elevador leva-me até 10º andar, os últimos dois são feitos a pé. Á porta da caixa do elevador um velho tapete, cofre para a chave dos meus momentos. Assim que saiu para o topo do edifício e fecho a porta nas minhas costas tudo o resto desaparece...sou invadido, roubado de todas as marcas de um mês de espera...tiro a roupa, dispo o relógio, sento-me no parapeito e espero...calmamente o momento agarra-me, não me deixa cair, levanta-me, eu enrosco-me nos seus braços e deixo-me ir...deixo-me ir até à segunda terça de Dezembro.

8 Comments:

Blogger zp said...

bom momento

03:40  
Blogger carlos said...

gostei muito do que me deixaste a ver quando acabei de te ler.
abraço

23:42  
Blogger ziggy said...

O tempo é sempre tão breve quanto o fazemos ser mas nunca tão lento como os nossos desejos, não é?
Muito bom e até à segundaterça de Dezembro ;-)

00:02  
Blogger diogo said...

Excelente ideia. Abraço

15:59  
Blogger carlos said...

Ok, agora a sério, gosto muito da tua incompetencia para a hipocrisia mas a imagem Wim Wenderiana vale por si, não pelo autor.

16:13  
Blogger HParracho said...

A avaliar pelos textos riquissimos colocados no blog do rosis a incompetencia não se fica pela hipocrisia... no campo da imaginação e da capacidade de abstração o amigo garry pouco deve a uma pedra da calçada. Adoro a critica construtiva e adoro a falta hipocrisia mas acima de tudo adoro a capacidade que alguns de nós temos para ver numa imagem a preto e branco os tons de cinzento.A imagem fica para quem a consegue ver...

13:38  
Anonymous Anónimo said...

O meu caro amigo peco desculpa se o ofendi...nao imagina o quanto devo as pedras da calcada.
Os textos do rosis foram apenas happenings dos meus primeiros tempos aqui em Edmonton nunca pretenderam ser textos com devaneios pseudo literarios.
Agora permita-me mais um reparo, primeiro diz que a minha "imcompetencia nao se fica pela hipocrisia..." mas mais a frente diz que adora a "...falta de hipocrisia..."
Fiquei um bocado baralhado, sera que queria dizer frontalidade quando diz "falta de hipocrisia"???
Nem e agua nao e vinho nem agua-pe esta
escrita totosiana entenda-se...va la talvez Ice Tea de Melancia.
Aposto que deve adorar os postings tipo redaccao de escola C + S a contar as tropelias num autocarro algures em Budapeste.
Troca de galhardetes so quando jogava no Estrela do Mar Futebol Clube no saudoso Campeonato do Oeste.

08:02  
Blogger HParracho said...

com a certeza de que vamos tentar melhorar as nossas redacções por forma a não inquietar o seu espirito critico.
com a certeza de gostar muito dos genuinos relatos dos autocarros de bupeste, vou continuar a le-los.
com a certeza de que não fico ofendido continuo á espera de umas linhas suas para poder ter o prazer de ler algo escrito por alguém que tão bem lê e melhor comenta.
sem mais galhardetes desejo-lhe as melhoras rapidas e um feliz ano novo.
Um forte abraço meu caro Garry...

12:18  

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